A Reforma e as Reformas do Catolicismo no Século 16

Talvez fosse a hora de pararmos de falar em “A Reforma Protestante do Século 16” e começarmos a falar em “As Reformas do Catolicismo no Século 16”…

Se conversarmos com um luterano, a Reforma, para ele, foi só a de Lutero (1483-1546). A Reforma Protestante do Século 16 iniciada por Lutero comemorará 500 anos em 31/10/2017.

Se conversarmos com um calvinista, a Reforma, para ele, foi só a de Calvino (1509-1564), a de Lutero tendo mantido várias características do Catolicismo (em especial no tocante à Eucaristia). Lutero, pelo que consta, até acreditar na Virgindade Perpétua de Maria acreditava… Quando Lutero pregou suas 95 Teses na porta da Igreja do Mosteiro de Wittenberg, Calvino estava, provavelmente, brincando com bolinhas de gude: tinha nove aninhos.

Se conversarmos com um luterano e um calvinista, ambos juntos, provavelmente eles admitirão que tanto Lutero como Calvino foram reformadores, que concordaram em muita coisa, mas vão caracterizar a Reforma Anglicana de Henrique VIII (1491-1547) como uma piada, um mero verniz debaixo do qual continuou o Catolicismo, só que sem o Papa. (Prova posterior disso é que, no século 19, muitos anglicanos famosos voltaram para a Igreja Católica do Papa – algo que rarissimamente acontece com luteranos e calvinistas).

E se conversarmos com um defensor da chamada Reforma Radical (Anabatista e assemelhados), liderada, entre outros, por Balthazar Hübmaier (1480-1528), o único desses que foi martirizado, nada do que foi mencionado até aqui (Reforma Luterana, Reforma Calvinista, Reforma Anglicana) é uma reforma digna do nome, porque, entre outras razões, todas essas assim chamadas “Reformas Magisteriais”, mantiveram um detestável vínculo estreito entre Igreja e Estado, à semelhança do que acontecia com a Igreja Católica – vínculo esse mantido até hoje, em muitos casos.

Até aqui, Quatro Reformas Protestantes. Mas há uma quinta, não-Protestante.

Nenhum desses quatro (luterano, calvinista, anglicano, radical) considera que a Reforma da Igreja Católica no Século 16 (a Reforma Tridentina, também chamada de Contra-Reforma) foi de fato uma reforma – pois manteve a autoridade Papal, do magisterium, da tradição!!!

O Movimento Reformista dentro do Catolicismo, iniciado [ver o parêntese no próximo parágrafo] com o inglês John Wycliffe (1320-1384), que gerou o movimento dos Lolardos, continuado com o tcheco Jan Huss (1369-1415), que gerou o movimento dos Hussitas, e que teve algum progresso com o italiano Girolamo Savonarola (1452-1498), que gerou o movimento conhecido como “dos Piagnoni”, e o holandês Desidério Erasmo (1466-1536, já em parte contemporâneo de Lutero), um dos líderes do Humanismo Renascentista, todos os quais pretendiam continuar com uma igreja, sem dividi-la, mas com algumas reformas, acabou produzindo no mínimo cinco igrejas diferentes: a Luterana, a Calvinista, a Anglicana, a Radical (Anabatista), e a Católica, com um verniz novo… Isso sem contar o Movimento Humanista Secular, que pode ser visto como, de algum modo, um resultado do Humanismo Renascentista, posteriormente reforçado pelo Iluminismo, e que acabou por produzir o Unitarismo.

[Parêntese: O nome de Pedro Valdo / Valdez (c. 1140 – c. 1205), que gerou o movimento dos Valdenses, poderia ser incluído nesta lista de precursores das Reformas do Século 16. Mas isto levaria a lista dos precursores da Reforma muito para trás, para o período anterior a Tomás de Aquino (1225-1274). Mas é possível escrever a história da igreja da perspectiva de seus reformadores e incluir nela inclusive os diversos movimentos monásticos.]

Em Salto, 30 de Março de 2017

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